domingo, 8 de maio de 2011

Caso Banrisul: diretor da DCS definia valores e distribuía dinheiro para quadrilha

extraído do Blog Sul21, de 08/05/11.

Igor Natusch
Investigações de fraudes no Banrisul resultaram em resultou em uma lista de 25 nomes

As investigações do Ministério Público sobre o esquema que tomou conta do marketing do Banrisul mostram que o caminho do dinheiro passava, primordialmente, por duas empresas de publicidade. Uma delas, a DCS, teria em seu diretor Armando D’Elia Neto, de acordo com o MP, uma das figuras mais ativas dentro da quadrilha que lesava os cofres públicos por meio do superfaturamento de orçamentos para estandes em feiras e confecção de materiais de divulgação do banco. Segundo as investigações do MP, cabia a Armando D’Elia Neto calcular os valores que seriam inseridos nos orçamentos, de forma que todos os envolvidos lucrassem com as licitações.
Armando tinha a tarefa de manipular os cálculos, receber os valores superfaturados e repassá-los ao Banrisul. Os procedimentos eram negociados diretamente com o empresário Davi Antunes de Oliveira, responsável por gerenciar as empresas envolvidas nas licitações fraudulentas. Segundo o MP, Davi e Armando eram sócios de fato em várias dessas empresas, em especial no caso da Conexão Sul Comunicação Visual Ltda.
Algumas trocas de e-mail entre Davi Antunes de Oliveira e Armando D’Elia Neto são usadas pelos investigadores para sustentar essa ligação. Em correio eletrônico de junho de 2009, Davi diz a Armando que “precisamos ver mágicas hoje”, em uma conversa cheia de referências a ações publicitárias e valores em dinheiro. Em mensagem posterior, de março de 2010, Davi fala em “2000 graxeras prontas que temos que desovar”, de forma que seja possível “ganhar algum forte para a empresa e nós”. Houve também intensa troca de telefonemas entre os dois, inclusive combinando atitudes contra Luciano de Oliveira Totti, ex-subcontratado que manifestou disposição de denunciar a ligação criminosa entre os acusados.
Caberia também a Armando D’Elia Neto a distribuição dos valores arrecadados com os superfaturamentos. No dia em que foi detido pela Polícia Federal, o diretor da DCS tinha em sua casa valores de R$ 65 mil, U$ 23 mil, 50 mil euros e quase 6 mil libras. Em seu escritórios, os montantes eram ainda mais elevados, alcançando R$ 2.6 milhões, U$ 122 mil, 21 mil euros e 4.500 libras. As suspeitas do Ministério Público davam conta de que todo esse dinheiro era destinado ao pagamento dos integrantes da quadrilha. Suspeitas que ganham força a partir de ligação de Davi Antunes de Oliveira a Guilherme Thiesen, funcionário da Conexão Sul:
DAVI - Tu viu que o amigo tinha escondido e que era dele?
GUILHERME – Não, o quê?
DAVI - Dois milhões lá na sala (escritório). Tu acredita nisso? Que ele tinha dois milhões escondidos na sala dele?
GUILHERME - Eu não acredito! Sério, bah… Ele sim tá fu, meu!
DAVI – Não só isso, cara: como ele não repassou a grana para o outro? (…) Olha velho, fez merda para caralho, por que nós não ganhamos isso, né?
GUILHERME - Nem perto né, nem perto… Bah, que drama!
Armando D’Elia Neto definia valores superfaturados para licitações
Uma das situações onde essa ligação criminosa teria ficado mais explícita foi nas ações de comunicação para a Expointer 2009. Atendendo solicitação direta de Walney Fehlberg, à época superintendente de marketing do Banrisul, Armando elaborou cálculos para a execução dos serviços, acrescentando no montante parcelas fixas a serem repassadas para Davi Antunes de Oliveira, Walney Fehlberg e Rodolfo Rospide Neto, ex-assessor da vice-presidência do Banrisul. Além disso, Armando D’Elia Neto e Antonio João Carlos Florio D’Alessandro, sócio-proprietário da DCS, incluíram no valor orçado o percentual de 10% devido à agência de publicidade contratada -– valor calculado sobre o total apresentado ao marketing do banco, já superfaturado, em um procedimento que caracteriza enriquecimento ilícito.
Reprodução
Em azul, estão destacados os valores confirmados pela licitação, que já haviam sido previamente superfaturados | Foto: Reprodução

Numerosas evidências mostram a interferência direta de Armando D’Elia Neto e Antonio D’Alessandro no superfaturamento de uma série de orçamentos. No caso do OC 29585, referente às peças publicitárias da Expointer 2009, os orçamentos foram direcionados de forma a que a Conexão Sul oferecesse valores menores que o das concorrentes Imobi Iventos e Silk Master. Já no OC 29584, também referente ao evento, a Conexão Sul venceu a Imobi Iventos e a Digisul, enquanto o OC 29557 teve a vitória da Conexão Sul sobre a Digisul e a Impressão Gráfica. Em todos os casos, os valores oferecidos pelas concorrentes foram manipulados de forma que a empresa de Armando e Davi Antunes de Oliveira fosse a contratada, ainda que os cálculos apresentados estivessem acima dos valores de mercado.
Armando deu dinheiro para amante de Walney Fehlberg
A relação entre Armando e Walney Felhberg era tão estreita que o diretor administrativo-financeiro da DCS chegou a interceder diretamente em questão delicada da vida pessoal de Walney. Desde sua prisão em SP, em setembro do ano passado, Walney Fehlberg teria se afastado de sua amante, chamada Paula. Coube a Armando, usando o nome José, tratar diretamente com Paula, servindo de intermediário entre ela e Walney e até mesmo entregando quantias em dinheiro à amante do colega de quadrilha. A própria Paula, interrogada no processo, reconheceu uma foto de Armando D’Elia Neto, identificando-o como José e afirmando que o conhecia por esse nome desde 2008, quando começou a manter relacionamento amoroso com Walney Fehlberg.
Conforme a amante explicou ao MP, Walney dava a ela R$ 300 por semana durante o período em que estiveram juntos – encargo assumido por José, ou Armando D’Elia Neto, assim que ficou claro que o relacionamento não poderia prosseguir. Walney alegou à amante que sua esposa tinha descoberto a relação extraconjugal e monitorava suas contas, de forma que criaria problemas caso tivesse conhecimento das movimentações financeiras. O acordo torna-se ainda mais concreto a partir de escuta telefônica realizada no dia 6 de agosto de 2010, na qual Armando e Paula conversam diretamente sobre o assunto:
ARMANDO – Eu queria agora era te dar essa assistência material pelo menos… Mas, se eu não conseguir hoje, na semana que vem com certeza nós vamos marcar e eu vou conversar melhor contigo.
PAULA — É, eu queria mesmo. Eu tô confiando muito em ti, sabe, José… Primeiramente eu tô confiando em Deus mas eu tô confiando muito em ti. Eu não vou dizer assim nada, eu não vou te cobrar nada… Me desculpa pelas minhas ansiedades assim… Mas no fim tu é a única referência que eu tenho. Olha, eu vou te dizer: eu só liguei pro Walney ontem… Bah, eu não quero falar o nome dele. Eu só liguei pra ele ontem por tua causa, porque eu sabia se eu ligasse pra ele, provavelmente ele ia te ligar, entendeu? E te dizer “ó, ela me ligou, vê o que que ela quer, mais ou menos”. Eu imaginei que isso fosse acontecer, entendeu? (…)
ARMANDO — Tá. Então nós vamos fazer assim, ó: eu vou te mandar agora aqueles 500 que nós tínhamos combinado e mais 100, tá?
PAULA – Tá. Tá.
ARMANDO — Pra ti poder resolver agora, pra esse período.
Logo em seguida, Armando e Walney Fehlberg conversaram sobre o mesmo assunto, evidenciando que a intervenção do diretor da DCS era realizada a pedido de Walney. Na conversa, Paula é tratada por Armando como “gordija”:
ARMANDO – O que mais que eu ia te falar… Ah! Tô conduzindo lá com aquela… Aquela… Tu pode… Tu tá meio longe de tudo aí ou não?
WALNEY – Tô, tô, tô
ARMANDO – A gordija aí, bah! A gordija tá me alugando, né?
WALNEY – É, não é brincadeira. Nós temos que enfiar uma piça na boca dela e tchau!
ARMANDO – Mas eu já tô dizendo… Bah! Hoje eu dei uma real nela. Eu disse “ó, o troço tá acabando e não tá dando” e não sei o quê. E ela disse “Ah! mas então é pela segunda vez que ele vai me”… Como é que ela falou…”Vai me abandonar” e não sei o quê. E eu disse “Não, mas não é isso”… Não dá, não dá… Que tá acabando e não sei o quê, e eu dei um troco para ela hoje.
WALNEY – Tá.
ARMANDO – E…
WALNEY – Não, e tchau, e tchau! Tchau, o quê que ela quer?
ARMANDO – “Mas ele não me atende”. Daí eu disse “ele não vai te atender, tu pode ligar 10 vezes, 100 vezes, o que for, ele não vai te atender e não tem conversa”.
WALNEY – É isso ai.
ARMANDO – Prá ver que não adianta, entendeu?
WALNEY – É.
Contatados pelo Sul21, os representantes da DCS não se pronunciaram diretamente sobre o assunto. Segundo um dos advogados que defendem Armando D’Elia Neto e Antonio D’Alessandro, Aury Lopes Júnior, ainda não há citação e os acusados não tiveram acesso aos autos, não tendo conhecimento dos apensos e demais detalhes da investigação. Somente a partir daí será apresentada a defesa escrita, dentro dos prazos estabelecidos pela Justiça.

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