domingo, 26 de junho de 2011

Os Frankensteins do governo Fo-Fo

por Paulo Muzzel, extraído do Blog RSGURGENTE.





No acordo do dissídio/2011, firmado há poucos dias com o Sindicato dos Municipários (SIMPA), que representa os 25 mil servidores de Porto Alegre, o governo Fo-Fo (Fogaça-Fortunati) comprometeu-se em iniciar uma ampla revisão do Plano de Carreira do funcionalismo municipal. O atual Plano, de 1988, além de totalmente defasado, foi mutilado pela aprovação, nestas duas últimas décadas, de um grande número de leis que, satisfazendo interesses de alguns setores específicos, ampliaram as diferenças de remuneração, “abrindo” o leque salarial da Prefeitura. A óbvia conseqüência é que hoje uns poucos ganham muito – temos servidores com remuneração total na faixa dos 20 mil reais –, e a imensa maioria insatisfeita, fazendo pressão através de movimentos reivindicatórios que defendem interesses funcionais de pequenos grupos.
É verdade que o governo Fo-Fo não foi nada original, outras administrações passadas também cometeram equívocos ao criar vantagens pontuais. Mas é verdade, também, que em apenas seis anos e meio o governo Fo-Fo se excedeu: aprovou um sem número de leis concedendo “generosas benesses” a pequenos grupos de pressão. Primeiro tivemos a criação da GRF – Gratificação de Resultado Fazendário. A AIAMU, entidade que representa os agentes fiscais de receita pressionou e conseguiu aprovar lei que aumentou consideravelmente a remuneração dos funcionários fazendários. Na prática uma absurda quebra de isonomia salarial que beneficiou especialmente os “príncipes” da Fazenda e da Prefeitura, os agentes fiscais. A seguir a GRF foi ampliada, beneficiando os servidores da Coordenação de Programação Orçamentária: virou GRF-CPO. Em seguida os procuradores municipais (PGM) conseguiram ampliar os efeitos das leis anteriores e aí a GRF-CPO virou GRF-PO-PGM, uma verdadeira “sopa de letras”. Tivemos até a criação de uma polpuda gratificação especial beneficiando uma pequena elite de “planejadores estratégicos” da Secretaria de Gestão (SMGAE). Que, infelizmente, planejam muito mas de prático realizam pouco, quase nada.
Prosseguindo nesta lógica, é óbvio que outros grupos funcionais passaram, também, a demandar. Seguiram-se as reivindicações dos médicos, dos engenheiros e arquitetos. Apoiados por entidades profissionais fortes: o Conselho Regional de Medicina (CRM/RS), o Sindicato Médico (SIMERS) e o Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul (SENGE/RS) aumentaram a pressão.
O governo Fo-Fo, é claro, sucumbiu. Concedeu este ano um abono aos médicos, com um custo mensal adicional de 708 mil reais. Depois, neste início de junho enviou um projeto que tramita na Câmara transformando o abono em significativo aumento real de salário que custará 25,5 milhões de reais por ano aos cofres municipais. Observação importante os efeitos da lei retroagem a janeiro. A alegação mais utilizada pelos que defendem o projeto de lei é que se trata da mera incorporação do abono, algo como trocar seis por meia dúzia. Ledo engano: o abono custa 708 mil reais/mês e a gratificação de incentivo médico (apelidada de GIM) criada pela nova lei custará três vezes mais, ou seja, 2,1 milhões de reais mensais. Acontece que os cerca de mil médicos beneficiados representam apenas um quarto dos quatro mil profissionais da área da saúde. Como ficarão as relações dos médicos com seus companheiros de trabalho? São cerca de um mil e seiscentos enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, sem falar nos farmacêuticos, auxiliares de laboratório, técnicos de radiologia, uma centena e meia de dentistas e auxiliares de odontologia, além de centenas e centenas de assistentes administrativos, compondo um “exército” de mais de três mil servidores “esquecidos”.
Vê-se que o projeto de lei que tramita na Câmara Municipal é mais um equívoco, um verdadeiro Frankenstein. Mesmo que não pretendesse verdadeiramente iniciar a discussão de um Plano de Carreira para toda Prefeitura, qualquer iniciativa de mudança salarial na área de saúde deveria contemplar, no mínimo, por uma questão de justiça e bom senso, os trabalhadores da saúde em sua totalidade e não apenas aqueles situados no topo da pirâmide salarial. Além disso, a despesa adicional com os médicos eleva o gasto com pessoal do município dos atuais 45,5% para algo em torno dos 46,5% da receita líquida, diminuindo o espaço para concessão de reajustes que atendam o funcionalismo como um todo. Oportuno lembrar: quando comprometimento atinge 51,3%, a Lei de Responsabilidade Fiscal suspende qualquer aumento de salários.
O desastre não pára aí: depois dos médicos o governo Fo-Fo anuncia um novo abono para os cerca de quatrocentos e cinqüenta engenheiros e arquitetos da Prefeitura. Eles fizeram recentemente uma “greve branca”: pararam a expedição de habite-se, de diretrizes municipais (DMs) e a aprovação de loteamentos e de projetos. Com o suspeitíssimo apoio do SINDUSCON e de empreiteiras, que até forneceram seus capacetes para utilização no movimento reivindicatório, obtiveram um abono – a ser concedido em breve -, além da promessa de um aumento definitivo através de lei a ser enviada ao legislativo.
Teremos aí um novo Frankenstein. Que, certamente, ameaça inviabilizar a reposição de inflações futuras de todo funcionalismo. O lamentável resultado de tudo isso é que os servidores da Prefeitura passam a ter uma certeza: o desejado novo Plano de Carreira é um sonho cada vez mais distante.

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