domingo, 12 de junho de 2011

Governo e Oposição

por Marcos Coimbra*

extraído do Blog do Noblat, de 12/06/11

Enquanto o governo Dilma enfrenta o problema de se rearrumar depois da saída de Antonio Palocci, a oposição resolve alguns dos seus, mas não consegue solucionar outros. Para os dois lados, o futuro imediato está longe de ser tranquilo.
Palocci era um ministro de ampla atuação, que conjugava, às tradicionais funções da Casa Civil - de assessoramento presidencial e acompanhamento e coordenação das ações do governo - várias outras.
Experiente no trato de questões econômicas, político tarimbado, interlocutor privilegiado da elite empresarial, era visto como o principal colaborador da presidenta, seu homem de confiança. Ela mesma o apresentava como um dos maiores responsáveis por sua eleição.
A Casa Civil já teve à sua frente pessoas de muitos tipos, que desempenharam suas funções cada uma à sua maneira. A maioria apenas assessorou o chefe de governo e foi esquecida, algumas se tornaram personagens centrais de sua época.
Umas se notabilizaram por sua atuação para dentro do governo, exercendo com energia a função de coordenação (como Dilma, no segundo governo Lula, e Leitão de Abreu, nos governos Médici e Figueiredo). Outras ocuparam o cargo dando-lhe conteúdo essencialmente político (como José Dirceu, no primeiro mandato de Lula).
Nos poucos meses em que foi ministro-chefe da Casa Civil de Dilma, Palocci talvez tenha sido o mais poderoso de todos. Pode ter sido menos ativo na gestão do governo que a própria Dilma quando ministra (nem precisaria ter sido, pois ela mesma era quem se sentava na cadeira presidencial).
Pode ter sido menos central que José Dirceu na liderança política, que é insuperável nesse papel pela sua importância no PT. Mas foi uma mistura dos dois.
Considerando que substituí-lo seria quase impossível, Dilma optou por redefinir a atuação da Casa Civil. E inovou ao convidar para ocupá-la uma pessoa como Gleisi Hoffman, em nada semelhante ao ex-ministro.
O fato é que o conjunto do governo terá que se reacomodar. Com a saída de alguém tão grande (politicamente) quanto Palocci, vários espaços vão se abrir e, se há coisa que dura pouco na política, são os espaços desocupados. Os pedaços disponíveis do poder que estava concentrado serão disputados pelos outros ministros nos próximos dias. Apenas alguns caberão a Gleisi.
Do lado da oposição, as questões são outras. Na Convenção Nacional realizada pelo PSDB no final de maio, as duas correntes do partido se enfrentaram e houve um só vencedor. A velha pendência entre Aécio e Serra acabou e prevaleceu o mineiro.
As mudanças na composição da executiva do partido não foram grandes: permaneceram o presidente e o secretário-geral, trocou-se o vice, foi inventado um Conselho Político para que Serra não ficasse sem algo para fazer.
O importante foi a vitória simbólica do aecismo, que unifica (pelo menos por enquanto) o PSDB nacional, reduzindo a influência das seções estaduais, a começar pela paulista, que perdeu sua proeminência histórica.
Pode-se dizer, portanto, que esse problema foi resolvido pelos tucanos. Só quem entendia pouco de sua dinâmica interna esperava que houvesse uma acomodação entre as correntes. Uma teria que derrotar a outra e foi o que aconteceu.
Mas isso não soluciona outras dificuldades. O PSDB pode estar mais unido hoje que em qualquer momento dos últimos anos. Continua, no entanto, sem ter clareza sobre o papel que deve desempenhar na vida política nacional, o que o leva a indefinições de conteúdo programático e discurso.
Um bom exemplo delas está no mais recente texto de Fernando Henrique. Intitulado “Novos Desafios”, passou quase despercebido, por ter sido publicado semana passada, em plena crise Palocci.
FHC dedica metade do artigo a uma análise do atual momento da economia internacional e dos desafios que as incertezas a respeito de sua evolução colocam para as sociedades emergentes.
Para o Brasil, em suas palavras, elas tornam necessárias “estratégias de convergência doméstica”. Sendo ainda mais claro: “(...) precisamos de uma estratégia consensual”, que ele mesmo esclarece não ser “(...) o Estado conduzindo o povo para objetivos definidos por um partido ou grupo de ideólogos”, mas “um consenso enraizado na sociedade sobre questões decisivas”.
Parece uma proposta de entendimento entre governo e oposição. Parece que propõe deixar de lado conflitos secundários e priorizar o fundamental.
Mas ele não resiste às suas antigas implicâncias contra Lula e o PT. A segunda parte do artigo é toda dedicada a destilá-las: refere-se ao ex-presidente como “Seu Mestre, que prometera ficar calado...”, diz que ele “joga em solo corriqueiro as questões políticas”, que é o “retorno da metamorfose ambulante operando com o costumeiro desdém aos princípios” e por aí vai.
Ou seja: vem aparentemente desarmado, em busca do “consenso enraizado”. Mas continua com as velhas mágoas no peito. Afinal, o que quer?

*Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi

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