segunda-feira, 30 de abril de 2012

A crise capitalista e suas repercussões políticas, por Angel Guerra Cabrera - de Cidade do México

publicada em Correio do Brasil.

29/4/2012 11:41,14
capitalismo
 A crise do capitalismo


Trata-se de uma crise civilizatória que exige transformar totalmente os padrões culturais e o sistema de produção e consumo como única forma de preservar a vida de nossa espécie. O capitalismo já ameaçou arrasar a civilização nos terríveis anos de guerra geral entre 1914 e 1945, agravados pela Grande Depressão de 1929 e culminados com o genocídio de Hiroshima e Nagasaki. Quem sabe em que tragédia maior teria terminado aquele drama se não fosse pela derrota infligida ao nazismo pelo Exército Vermelho.
O transtorno atual se iniciou em 1973, quando o presidente Richard Nixon interrompeu o deslizamento da economia estadunidense para o abismo, provocado pelos gastos da guerra do Vietnã, o aumento dos preços do petróleo e o declínio na taxa de lucro. Unilateral e ditatorialmente desligou o dólar – moeda de câmbio internacional – do padrão ouro e o pôs a “flutuar”. Vulnerava assim, em proveito dos capitais ianques e em detrimento dos demais países – sobretudo os pobres – os acordos de Bretton Woods, que pautaram as regras da economia internacional sob a batuta dos Estados Unidos depois da Segunda Guerra Mundial.
A partir de então, Washington empreendeu uma demencial voragem de impressão de dólares e instrumentos de dívida sem respaldo produtivo, com os quais inundou os circuitos financeiros globais de moeda desvalorizada e levou à maior estafa da história da humanidade. A especulação financeira passou a ocupar um lugar muito mais relevante que a produção e o comércio na circulação monetária e reforçou as políticas neoliberais, experimentadas no Chile sob a ditadura de Pinochet (1973-1990), elevadas à categoria de dogma de fé mundial pelos governos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher (1979-1990).
São essas políticas generalizadas de diminuição do Estado, contenção salarial, desmantelamento das conquistas dos trabalhadores, circulação livre de capitais mas não da força de trabalho, privatização do patrimônio público, socialização das perdas das corporações, especulação até com os alimentos, inclemente degradação ambiental e início de um novo ciclo de guerras coloniais (Afganistão, Iraque, Líbia), as quais têm conduzido à debacle econômica manifestada abertamente a partir do estouro da bolha imobiliária em Wall Street (2008).
Citada por poucos autores, outra causa fundamental, na ordem geopolítica, da descomunal ofensiva internacional do capital contra os trabalhadores e povos oprimidos, foi a queda da União Soviética e demais países da experiência socialista do Leste da Europa, empurrada sim, por gravíssimos erros e desvios de seus partidos dirigentes, mas também portadora de valiosas experiências na libertação humana e fator de equilíbrio até aquele momento no balanço internacional de poder. A arremetida capitalista foi favorecida pelos traumas subjetivos que a inesperada catástrofe provocou, aprofundados por uma vulgar campanha antissocialista que dura até hoje e a deserção para as fileiras do liberalismo econômico – sem exceção – das cúpulas social-democratas europeias e partidos associados em outras latitudes, assim como de muitos intelectuais. Enquanto isso, um número considerável dos partidos e grupos de orientação marxista e socialista demoraram a sobrepor-se à comoção e fazer uma leitura correta da nova realidade.
Em 2010 irrompeu na Europa a chamada crise da dívida soberana com graves consequências sociais, acentuadas pelo ultraliberalismo da senhora Merkel. A Espanha entrou de novo em recessão e se vaticina a rápida queda da importância, do tamanho de sua economia e sua quebra não distante, dadas a fragilidade de seus bancos, às extremas medidas de ajuste ordenadas por Berlim, cumpridas ao pé da letra pelo fidalgo Rajoy.
Sendo assim, arrastará consigo a União Europeia, atingirá os Estados Unidos, que padecem essencialmente os mesmos problemas, solapados pela suicida injeção de liquidez, e são, no final das contas, o maior responsável pela crise.
Angel Guerra Cabrera é jornalista do periódico La Jornada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário