quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

A Fundação de Saúde ou AFUNDAÇÃO DA SAÚDE?



Mais uma vez, a cidade de Porto Alegre está acompanhando o debate na Câmara de Vereadores sobre os destinos das políticas de saúde e, principalmente, do PROGRAMA/ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA. Agora, por iniciativa do Poder Executivo, o debate se dá em torno da proposta de criação do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família, uma fundação pública de caráter privado, para gerir o programa de saúde da família.
Só para lembrar, nos últimos quatro anos o município tem buscado uma saída para o gerenciamento deste programa e buscar uma ampliação das equipes que trabalham nesta importante tarefa de atender a população portoalegense.
Até 2007, o programa era gerido por convênio entre o município e a FAURGS. Tal convênio foi extinto por determinação judicial. Para não interromper o programa, foi estabelecido um convênio com o Instituto Sollus, de São Paulo, abrindo uma experiência nefasta para Porto Alegre, este convênio vigorou até meados de 2009, quando foi rompido sob denúncias de malversação de recursos públicos e corrupção da ordem de 10 milhões de reais. A partir de agosto de 2009 a administração do convênio passou a ser exercida pela Fundação Instituto de Cardiologia.
Aliás, desde 2007, quando da extinção do convênio com a FAURGS, a execução do programa de estratégia da Saúde da Família vem passando por sobressaltos, praticamente, anualmente.
Após, ter enviado em 2009, um projeto cheio de erros, sendo o mais gritante o fato de criar um Departamento dentro da Secretária da Saúde para coordenar a ESF onde todos os cargos seriam providos por servidores vinculados à CLT, contrariando a constituição que determina o REGIME JURÍDICO ÚNICO, e tal regime no município de Porto Alegre ser o ESTATUTÁRIO (LC 133/87). 
Em 2009, o Poder Executivo Municipal, tal qual um mágico que vive a tirar coelhos de uma cartola, apresenta o IMESF, fundação pública de direito privado, como solução para o problema. Ocorre que é mais uma solução sem consenso e que poderá até ser aprovada na Câmara, pela maioria governista existente no plenário, mas, que tem a oposição de boa parte da base não governista e dos Sindicatos e Entidades que têm assento no Conselho Municipal de Saúde (CMS) e no Conselho Nacional de Saúde (CNS).
E mais uma vez, o debate não é feito a luz de argumentos que justifiquem a criação de uma instituição, que hoje não esta abrigada na Constituição Federal de 1988.  Ou que justifiquem a transformação de recursos públicos aplicados na saúde e no programa de saúde da família, virem receita de uma entidade privada para serem aplicados no que hoje já é feito. Por exemplo: alguém já esclareceu qual será a natureza tributária do IMESF? Para os ciosos da carga tributária, vale lembrar que ao repassar recursos públicos para um instituto de direito privado, estaremos tributando os mesmos, pois para esse serão receita privada.
Um dos argumentos apresentados são os preconceitos de sempre contra os servidores públicos: “os médicos não cumprem a carga horária e nem prestam um bom atendimento”. Ora, dito assim, é quase impossível encontrar alguém que se oponha. Entretanto, não é dito que se hão médicos que apresentam o comportamento referido, não são médicos vinculados ao PSF e sim de outras unidades da SMS.  E, portanto, a criação ou não do IMESF, não acarretará nenhum efeito prático para tais serviços. Aliás, mesmo que acarretasse a pergunta que se deve fazer é que nível de gestão existe na PMPA, na atual gestão, que se precisa criar um órgão para fazer seus servidores cumprirem sua carga horária?
Outro argumento que tem sido muito utilizado pelos agentes públicos na defesa do Projeto é de que os trabalhadores mesmo vinculados ao regime celetista terão estabilidade no emprego. Ora, se há dois estatutos jurídicos que não combinam são regime celetista e estabilidade. Os custos da contratação de um trabalhador pelo regime da CLT, entre eles o FGTS, foram constituídos prevendo que não há estabilidade no contrato de trabalho. De outra forma, os funcionários públicos regidos por regime estatutário não têm direito ao FGTS. Logo, pretender garantir estabilidade a profissionais contratados pela CLT é criar-se um privilégio, que como contrapartida justa teria que estender o direito ao FGTS aos estatutários do município.
Por fim, cabe ao Chefe do Executivo Municipal questionar por que suas propostas têm encontrado tamanha resistência entre os principais agentes envolvidos no tema da saúde. Será que ele e alguns poucos prefeitos de municípios vizinhos que buscaram solução idêntica os visionários lutando contra os moinhos de vento, quero dizer, corporativistas.
Tendo em vista, a insegurança jurídica do caráter do instituto e a falta de consenso com boa parte da sociedade e os agentes de saúde envolvidos no debate, temo que não se esteja discutindo a criação de uma FUNDAÇÃO DE SAÚDE, mas, sim, a AFUNDAÇÃO DA SAÚDE.


Zé Reis
Secretário Municipal de Administração de Porto Alegre, em 2001-2002, e Secretário Geral do PT de Porto Alegre.