A Constituição da República do Brasil,
entre outras questões, versa sobre os Direitos e Garantias que os indivíduos
possuem, inclusive contra o próprio Estado. São garantias constitucionais aos
indivíduos, previstas no art. 5º, inc. XI, a inviolabilidade à intimidade, à vida privada, à honra e à
imagem das pessoas.
Por ser funcionário público municipal,
tive estas garantias retiradas no dia 03/07, quando a Prefeitura Municipal de
Porto Alegre deu conhecimento do meu salário, através da internet, baseada na
interpretação da chamada Lei da Transparência, que se transformou num novo
instrumento de caça de marajás e corruptos, e não num instrumento de
transparência e controle como pretendiam os legisladores.
Desta forma, aqui em Porto Alegre, eu e
os demais 26.000 servidores públicos, a exemplo de outros milhares de
funcionários públicos espalhados pelo país, passamos a ser INDIVÍDUOS distintos
e rebaixados perante a Constituição, pois, para nós a mesma não se aplica integralmente.
Além disso, passamos a ser expostos à luz do dia, a exemplo dos animais em um
zoológico. Agora, quando transitarmos nas ruas, estaremos sujeitos a encontrar amigos,
familiares e pessoas que nem conhecemos tratando de nossa remuneração, sem qualquer
consentimento nosso.
E qual argumento sustenta tal violação
de privacidade que se “pretende legal”? O fato de que a população paga os
impostos e por isso tem o direito de saber a remuneração de cada servidor
público, já que seria “nosso patrão”.
Ora, me parece que a Ciência Política,
já havia explicado que a muitos anos atrás a sociedade delegou poderes ao ente
estado, para administrar os seus interesses coletivos. Para administrar este
ente, delegou a seus representantes legais, eleitos por ela mesma, nas
democracias.
O estamento legal e administrativo
desenvolveu-se a tal ponto que passou a determinar e exigir que o acesso ao
emprego público se desse por processo seletivo, chamado concurso público, à
exceção dos cargos de livre exoneração e nomeação, para evitar a nomeação de
apaniguados e compadrios. Quando um cidadão ou cidadã habilita-se a um cargo
público, em regra, é dada toda a publicidade.
Ao tomar posse, outro ato ao qual se dá
publicidade, o servidor assina um contrato de trabalho com o ESTADO sujeita a
normas e regras também conhecidas através dos estatutos. Toda a vida funcional
e laboral do servidor é divulgada através de publicações dos atos que lhe
concedem qualquer vantagem, pecuniária ou não, e dos que retiram através de
punições. Entretanto, até hoje, por conta das garantias constitucionais, lhe
era garantido á privacidade ao seu salário. Agora, não mais. Estamos expostos.
Nosso contrato de trabalho foi alterado, mais uma vez, em nome de uma moral
duvidosa.
No entanto, esta lógica de que por
pagar impostos os cidadãos e cidadãs são nossos patrões, e por isso devem tomar
conhecimento de nossos salários, pergunto se a mesma não pode ser estendida a
outros, por similaridade.
Vejamos outra abordagem. Na composição
do preço de qualquer mercadoria ou serviço está embutido o custo do pagamento
dos trabalhadores que executaram aquele produto ou serviço. Logo, ao pagar por
este produto estou também pagando parte do salário dos mesmos. Por
similaridade, então, também sou patrão do trabalhador que produziu aquele bem
ou serviço. Assim, também devo ter o direito de conhecer a sua remuneração?
Provavelmente, dirão que não.
Mas, que lógica canhestra é esta? Por
que não posso exigir que ao entrar num estabelecimento qualquer estejam
expostos os salários de todos que trabalham no estabelecimento para eu saber
quanto valor do bem ou serviço comporá a remuneração daquele trabalhador ou
trabalhadora. Em especial, em deveríamos aplicar este princípio nas empresas e
estabelecimentos que executam serviços concedidos pelo estado ou que recebam
verbas públicas de qualquer natureza.
Certamente, alegarão que é uma relação
privada. Mas, a relação do funcionário público com o estado também não é
privada. Ou, para estes, vale a lógica do “grande irmão”, da Revolução dos
Bichos. Devem ser expostos a uma VIOLAÇÃO LEGAL DE SUA PRIVACIDADE, perdendo
Direitos e Garantias constitucionais, pois são potenciais corruptos e marajás.
*funcionário
público municipal, economista e cientista político.
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